Sob o regime da comunhão universal após o advento do
novo Código Civil
Texto
extraído do Jus Navigandi
AUTORES
Wendel
de Brito Lemos Teixeira
advogado em Uberlândia (MG), Escritório de Advocacia José Américo Fonseca Attie S/C
José Américo Fonseca Attie
advogado em Uberlândia (MG), Escritório de Advocacia José Américo Fonseca Attie S/C
advogado em Uberlândia (MG), Escritório de Advocacia José Américo Fonseca Attie S/C
José Américo Fonseca Attie
advogado em Uberlândia (MG), Escritório de Advocacia José Américo Fonseca Attie S/C
1 – A polêmica sobre a legalidade da sociedade
comercial entre cônjuges casados sob o regime da comunhão universal de bens a
legalidade da constituição de sociedade entre cônjuges casados sob o regime da
comunhão universal sempre foi questão bastante polêmica.Com o advento do novo
código civil, a polêmica que já era grande, multiplicou-se muito, ao proibir
expressamente a sociedade entre cônjuges casados sob o regime da comunhão
universal, conforme se percebe, in verbis: "art. 977 – Faculta-se aos
cônjuges contratar sociedade, entre si ou com terceiros, desde que não tenham
casado no regime da comunhão universal de bens, ou no da separação
obrigatória." Percebe-se facilmente que de acordo com o dito diploma,
pessoas casadas entre si sob o regime da comunhão universal não podem
constituir sociedade comercial.A questão piora muito quando se tem notícia que
inúmeras Juntas Comerciais do país estão impedindo os sócios casados em
comunhão universal de bens de abrirem filiais e fazendo com que pessoas busquem
excluir um dos cônjuges da sociedade. visando dar pequena contribuição às
letras jurídicas, pretendemos analisar a legalidade das sociedades entre
cônjuges constituídas anteriormente ao advento do novo código civil de 2003 e o
impacto deste diploma legal nas referidas sociedades.
2 – A legalidade das sociedades comerciais entre
cônjuges casados sob o regime da comunhão universal de bens antes do advento do
novo código civil como dito alhures, a discussão sobre a legalidade ou não das
sociedades comerciais entre cônjuges sempre foi questão altamente
controvertida. Os defensores da impossibilidade destas sociedades viam nestas
um instrumento para burlar o regime de bens do casal com finalidades diversas como,
por exemplo, lesionando herdeiro em detrimento de outro, dilapidando
patrimônio em prejuízo de credores etc. Carvalho de Mendonça defendia a
ilegalidade das sociedades entre cônjuges: "Interessante questão é a
seguinte: podem os esposos contrair sociedade comercial entre si? Parece-nos
que não... Se o casamento é sob o regime da comunhão de bens, não há vantagem
na sociedade, quer relativamente aos cônjuges, quer relativamente aos credores.
Quanto aos primeiros porque os lucros dos negócios seriam comuns, houvesse ou
não a sociedade. Quanto aos segundos, porque as suas garantias não melhoriam...
A sociedade entre esposo deve, pois, considerar-se nula. A nulidade é de ordem
pública." (1) Apesar dos entendimentos contrários supracitados defendendo
que a sociedade comercial entre cônjuges casados sob o regime da comunhão
universal de bens é nula e da autoridade de quem defende tal posicionamento,
entendemos que a sociedade comercial entre sócios casados sob o regime da
comunhão universal antes do advento do Código Civil de 2.003 é totalmente
lícita. O Estatuto da Mulher Casada (Lei 4.121/62) que foi um marco nos
direitos das mulheres e na proteção de seu patrimônio estipulou: "Pelos
títulos da dívida de qualquer natureza, firmados por um só dos cônjuges, ainda
que casados pelo regime da comunhão universal, somente responderão os bens
particulares do signatário e os comuns até o limite de sua meação."
Utilizando-se da análise teleológica e extravasando a interpretação literal,
percebe-se que este dispositivo legal consagrou o patrimônio separado da esposa
e do marido, mesmo que o regime de bens for o da comunhão universal. Outro
motivo pelo qual se considera a sociedade comercial entre cônjuges casados sob
o regime da comunhão universal lícita, dá-se pelo fato de inexistir na época de
sua constituição qualquer proibição legal. Trata-se da emanação do preceito
previsto no art. 5º, II da Constituição Federal brasileira: "ninguém será
obrigado a fazer ou deixar de fazer alguma coisa senão em virtude de lei."
O Supremo Tribunal Federal, o grau maior do Poder Judiciário, avaliza este
posicionamento: Recurso extraordinário. Execução fiscal. Penhora de bens de
sócio. Embargos de terceiro. Reputa-se licita a sociedade entre cônjuges,
máxime após o Estatuto da mulher casada. O sócio não responde, em se tratando
de sociedade por quotas de responsabilidade limitada, pelas obrigações fiscais
da sociedade, quando não se lhe impute conduta dolosa ou culposa, com violação
da lei ou do contrato. Hipótese em que não ha prova reconhecido NAS
Administrações e Participação Ltda. decisões das instancias ordinárias de a
sociedade haver sido criada objetivando causar prejuízo a Fazenda, nem tampouco
restou demonstrado que as obrigações tributariam resultaram de atos praticados
com excesso de poderes ou infração de lei, contrato social ou dos estatutos,
por qualquer dos sócios. Embargos de terceiro procedentes. Sumula 279. Recurso
extraordinário não conhecido.
(STF
- RE 108728 / SP - SAO PAULO - RECURSO EXTRAORDINÁRIO - Relator(a): Min.
NERI DA SILVEIRA - Julgamento: 03/02/1989 Órgão Julgador: PRIMEIRA TURMA -
Publicação: DJ DATA-14-11-91 PP-16358 EMENT VOL-01642-02 PP-00246 – Votação
unânime – não conhecido)
O
STF no RE 76953 – SP também decidiu que a sociedade entre cônjuges é lícita
Assim, entendemos que a sociedade comercial entre
marido e mulher casados sob o regime da comunhão universal anteriormente ao
novo código civil é totalmente legal.
3 – A desnecessidade de alteração do contrato social
das sociedades comerciais entre cônjuges casados sob o regime da comunhão
universal constituídas anteriormente à vigência do novo código civil como dito
alhures, o novo código civil que entrou em vigor em 11 de janeiro de 2.003
impõe que não pode haver sociedade entre cônjuges casados sob o regime da
comunhão universal. Como é cediço, o art. 2.031 do Código Civil atual ordena às
sociedades constituídas na forma da lei anterior que se adaptem as disposições
do novo código civil: "art. 2.031 – As associações, sociedades e
fundações, constituídas na forma das leis anteriores, terão o prazo de um ano
para se adaptarem às disposições deste Código, a partir de sua vigência; igual
prazo é concedido aos empresários." (negrito e sublinhado nosso) desta
forma, uma primeira interpretação do art. 977 e 2.031 leva-nos a crer que todas
as sociedades comerciais entre cônjuges casados sob o regime da comunhão
universal constituídas anteriormente ao novo código civil, deverão alterar seu
contrato social, excluindo um dos cônjuges. O fato do art. 977 do novo código
civil (lei 10.406/2002) vedar a possibilidade da constituição da sociedade
entre cônjuges casados sob o regime da comunhão universal de bens e o art. 2031
ordenarem que as sociedades comerciais se adaptem ao novo diploma legal, não
faz com que estas empresas constituídas anteriormente à entrada em vigor do
novo código civil tenham que alterar seu quadro social. Desta forma, somente
são ilegais (nulas), as sociedades entre cônjuges casados em comunhão universal
constituídas após 11 de janeiro de 2.003. As sociedades entre cônjuges casados
sob o regime da comunhão universal anteriormente à data supra, são legais,
desnecessitando de qualquer alteração, sob pena de afrontar o princípio do
direito adquirido, do ato jurídico perfeito e da segurança jurídica
conforme previsão do art.5º, XXXVI da Constituição Federal. O brocardo "lex
non habet oculos retro", ou seja, "a lei não olha para trás"
é aplicável no presente caso. Como é cediço, existe no direito a seguinte
máxima: tempus regit actum (o ato é regido pelo tempo em que foi feito).
Assim, percebe-se mais uma vez, que as sociedades comerciais constituídas
anteriormente à vigência do novo código civil devem ser regidas pela lei da
época de sua constituição, qual seja, o código civil de 1916. Como não existia
nenhuma lei impedindo a constituição de sociedade entre cônjuges casados sob o
regime da comunhão universal, ao contrário do que existe atualmente, não há se
falar em qualquer ilegalidade. Sérgio Campinho, um dos maiores
comercialistas da atualidade, defende que a impossibilidade de constituição de
sociedade entre cônjuges sob o regime da comunhão de bens somente se aplica às
sociedades criadas após a entrada em vigor do novo código civil:
"Porém a nova ordem só se aplica às sociedades que venha a se
constituir após a vigência do novo Código, não se fulminando de nulidade as
sociedades validamente contratadas segundo as regras contemporâneas ao seu
surgimento, nas quais não havia a restrição ora traçada. E isso se faz em
atenção ao princípio constitucional que garante não poder a lei prejudicar o
direito adquirido e o ato jurídico perfeito (Constituição Federal, artigo 5º,
XXXVI)." (2)
Por via de
consequência lógica, entendemos que não é necessária nenhuma modificação no
quadro societário da empresa, haja vista que o art. 2.031 do CC é
inconstitucional. É inconstitucional porque afronta o direito adquirido e o ato
jurídico perfeito ao querer aplicar uma lei nova à negócios jurídicos que se
deram antes de sua entrada em vigor as leis retroativas causam repugnância
entre os operadores do Direito. O grande Hans Kelsen entende da mesma
forma: "As leis retroativas são consideradas censuráveis e indesejáveis
porque fere nosso sentimento da justiça infligir uma sanção, especialmente uma
punição, a um indivíduo por causa de uma ação ou omissão às quais o indivíduo
não poderia saber que se vincularia tal sanção." (3) Os contratos das
sociedades comerciais entre cônjuges casados sob o regime da comunhão universal
de bens é considerado ato jurídico perfeito e o direito deste casal de ter a
empresa de que são proprietários regida pela legislação da época em que foi constituída
denomina-se direito adquirido. O Código Civil que atualmente abarca grande
parte da legislação comercial não pode retroagir, conforme se percebe das
palavras de Antônio Jeová dos Santos: "Nada disso, porém, pode
servir como pretexto de se emprestar efeito retroativo às regras do Código
Civil de 2.002, porque a insegurança seria muito mais deletéria do que eventual
imobilismo e estratificação do Direito. Os jurisdicionados necessitam estar
seguros e terem certeza de que a lei posterior em nada modificará sua vida de
relação e seus negócios, desde que tenham sido concretizados à época da lei
revogada." (4) Como é notório no âmbito jurídico, as normas legais
infraconstitucionais (mesmo que de ordem pública) não podem retroagir para
alcançar contratos, como por exemplo, de constituição de sociedade comercial
estabelecidos antes de sua vigência, sob pena de afrontar os princípios da
irretroatividade da lei, segurança jurídica, estabilidade e paz social. O
Supremo Tribunal Federal aponta no mesmo sentido: "COMPROMISSO DE COMPRA E
VENDA – Contrato celebrado antes da vigência do Código de Defesa do Consumidor
– Estipulação da perda total das obrigações pagas no caso de rescisão da avença
– Impossibilidade da declaração de nulidade, mesmo que o rompimento do ajuste
tenha ocorrido após a entrada em vigor da Lei 8078/90 – Entendimento contrário
que fere o princípio de que a lei não pode prejudicar o ato jurídico perfeito –
Inteligência do art. 5o, XXXVI, da CF. Ementa Oficial: Sendo
constitucional o princípio de que a lei não pode prejudicar o ato jurídico
perfeito, ele se aplica também às leis de ordem pública.
De outra parte, se a cláusula relativa à rescisão
com a perda de todas as quantias já pagas constava do contrato celebrado
anteriormente ao Código de Defesa do Consumidor, ainda quando a rescisão tenha
ocorrido após a entrada em vigor deste, a aplicação dele para se declarar nula
a rescisão feita de acordo com aquela cláusula fere, sem dúvida alguma, o ato
jurídico perfeito, porquanto a modificação dos efeitos futuros de ato jurídico
perfeito caracteriza a hipótese de retroatividade mínima que também é alcançada
pelo disposto no art. 5o, XXXVI, da Carta Magna." (SUPREMO
TRIBUNAL FEDERAL - RE 205.999-4-SP – 1a T. – j. 16.11.1999 – rel.
Min. Moreira Alves – DJU 03.03.2000 - REVISTA DOS TRIBUNAIS, Volume 778, Página
204). “LEI Nº 8.030/90. EFEITOS RETROATIVOS SOBRE CONTRATOS ANTERIORES A SUA
EDIÇÃO. ART. 5º, XXXVI, DA CF/88. OFENSA DIRETA. 1. O controle de
constitucionalidade exercido em hipóteses de ofensa ao princípio da
irretroatividade das leis (art. 5º, XXXVI, da CF/88) pressupõe a interpretação
da lei ordinária, cuja validade se pretende questionar, não havendo que se
falar em ofensa indireta. 2. O despacho agravado fundou-se em jurisprudência
consolidada deste Supremo Tribunal, no sentido de que, no nosso ordenamento
jurídico, a legislação infraconstitucional, ainda quando de ordem pública, não
pode retroagir para alcançar ato jurídico perfeito. 3. Agravo regimental a que
se nega provimento. (STF - RE 263161 AgR / BA – BAHIA - AG.REG.NO RECURSO
EXTRAORDINÁRIO - Relator(a): Min. ELLEN GRACIE - Julgamento: 08/10/2002 -
Órgão Julgador: Primeira Turma - Publicação: DJ DATA-06-12-2003 PP-00065 EMENT
VOL-02094-02 PP-00391 – Votação unânime: desprovido) O grande Carlos
Maximiliano aponta pela impossibilidade de uma lei nova atingir um contrato
pretérito, ou mesmo seus efeitos: "Os efeitos de contrato em curso no dia
da mudança de legislação regulam-se conforme a lei da época da constituição do
mesmo." (5) (negrito e sublinhado nosso) Maria Helena Diniz não
discrepa: "Se o contrato foi legitimamente celebrado, os contratantes têm
o direito de vê-lo cumprido, nos termos da lei contemporânea a seu nascimento,
que regulará inclusive seus efeitos. Deveras, os efeitos do contrato ficarão
condicionados à lei vigente no momento em que foi firmado pelas partes. Aí não
há que se invocar o efeito imediato da lei nova (RT, 660:109 e 547:215; RTJ,
90:296 e 86:296)." (6) Luiz Antônio Rizzato Nunes arremata:
"tem havido certa confusão, especialmente em decisões judiciais,
relativamente ao aspecto da retroatividade da norma jurídica, pelo fato de ela
ser pública ou privada. Mas acontece que não é a qualidade da lei que faz com
que ela possa ou não retroagir.
A Constituição Federal não deixa margem a dúvidas:
as garantias estabelecidas contra a retroatividade das leis (o direito
adquirido, o ato jurídico perfeito e a coisa julgada), no inciso XXXVI do art.
5º da Constituição Federal, aplicam-se indistintamente contra qualquer espécie
de lei. Não é porque uma lei é de ordem pública que ela pode retroagir, ferindo
aquelas garantias. A Carta Constitucional fala apenas em ‘lei’, donde se deve
inferir que está tratando de ‘toda espécie de lei." (7) A
aplicação do art. 2.031 do CC aos efeitos dos contratos constituídos
anteriormente ao novo código civil seria o que a doutrina e jurisprudência
chama de retroatividade mínima ou retroatividade injusta,
expressamente vedada quando se tratar de lei infraconstitucional. A
retroatividade mínima ocorre quando os efeitos de ato jurídico realizado sob a
égide da lei anterior é atingida por lei posterior. A impossibilidade de
irretroatividade mínima de norma infraconstitucional (como é o caso do novo
código civil) é questão pacificada no órgão máximo do Judiciário, o Supremo
Tribunal Federal conforme nota-se infra: Recurso extraordinário. Mensalidade
escolar. Atualização com base em contrato. - Em nosso sistema jurídico, a regra
de que a lei nova não prejudicará o direito adquirido, o ato jurídico perfeito
e a coisa julgada, por estar inserida no texto da Carta Magna (art. 5º, XXXVI),
tem caráter constitucional, impedindo, portanto, que a legislação infraconstitucional,
ainda quando de ordem pública, retroaja para alcançar o direito adquirido, o
ato jurídico perfeito ou a coisa julgada, ou que o Juiz a aplique
retroativamente. E a retroação ocorre ainda quando se pretende aplicar de
imediato a lei nova para alcançar os efeitos futuros de fatos passados que se
consubstanciem em qualquer das referidas limitações, pois ainda nesse caso há
retroatividade - a retroatividade mínima -, uma vez que se a causa do efeito é
o direito adquirido, a coisa julgada, ou o ato jurídico perfeito,
modificando-se seus efeitos por força da lei nova, altera-se essa causa que
constitucionalmente é infensa a tal alteração. Essa orientação, que é firme
nesta Corte, não foi observada pelo acórdão recorrido que determinou a
aplicação das Leis 8.030 e 8.039, ambas de 1990, aos efeitos posteriores a elas
decorrentes de contrato celebrado em outubro de 1.989, prejudicando, assim, ato
jurídico perfeito. Recurso extraordinário conhecido e provido. (STF - RE 188366
/ SP - SÃO PAULO - RECURSO EXTRAORDINÁRIO - Relator(a): Min. MOREIRA ALVES
- Julgamento: 19/10/1999 - Órgão Julgador: Primeira Turma - Publicação: DJ
DATA-19-11-99 PP-00067 EMENT VOL-01972-02 PP-00382 – votação unânime: conhecido
e provido) Querer aplicar a previsão do art. 2.031 do CC e o art. 977 do mesmo
código aos contratos de sociedade anteriores ao Código Civil atual, geraria
hipótese de retroatividade máxima, que é inadmissível no Brasil por afrontar o
art. 5º, XXXVIII da CF. Se a retroatividade mínima para normas
infraconstitucionais já é vedada, com mais razão se dá a impossibilidade de retroatividade
máxima "também chamada restituitória, porque em geral restitui as
partes ao `status quo ante`, quando a lei nova ataca a coisa julgada e
os fatos consumados." (8) A retroatividade máxima ocorre quando
atinge o próprio fato consumado, a sua própria
natureza. No caso ora analisado,
querer aplicar o 2031 e o art. 977 do novo código civil às sociedades
comerciais entre cônjuges casados sob o regime da comunhão universal de bens
caracterizaria caso de retroatividade máxima, o que seria evidentemente
inconstitucional.
A pena forte de Sérgio Campinho defende a
inaplicabilidade do art. 2.031 do CC para se exigir a alteração do quadro
social das sociedades comerciais constituídas entre cônjuges casados sob o
regime da comunhão universal: "A regra do art. 2.031 é aplicável, por
exemplo, na hipótese de uma sociedade limitada, integrada por mais de dez
sócios, que passa a ter a assembléia geral como um órgão de deliberação
obrigatório. Não serve, dessa feita, para nulificar uma sociedade validamente
contratada pelos cônjuges anteriormente à vigência do Código. Nem seria o caso
de forçar a conversão do regime de bens. A uma, porque, no caso da separação
obrigatória, não há margem para a conversão; a duas, porque seria uma
violência, não amparada pelo regime da comunhão universal, a alteração do
regime de bens, como condição para manterem-se validamente sócios em uma
sociedade. Seria uma surpresa para ambos, impondo-lhes uma condição inexistente
à época em que fizeram as suas devidas opções. Acresce o argumento o fato de a
conversão do regime não depender exclusivamente da vontade dos cônjuges, mas de
decisão judicial para passar a produzir os seus efeitos." (9) A
ilegalidade, inconstitucionalidade e injustiça de se exigir a mudança do quadro
social de sociedade entre cônjuges faz nascer decisões e atitudes jurídicas
louváveis. Cite-se o parecer do braço jurídico do Departamento Nacional de
Registro do Comércio que deve ser seguido por todas as juntadas do país em que
aponta pela desnecessidade de tal mudança. (10) Também entendemos
que a proibição das sociedades de cônjuges casados sob o regime da comunhão
universal de bens de abrirem filiais após o advento do novo código cível é
descabida. Importante analisar o telos do art. 977 do novo código civil:
"art. 977 – Faculta-se aos cônjuges contratar sociedade, entre si ou com
terceiros, desde que não tenham casado no regime da comunhão universal de bens,
ou no da separação obrigatória." Mediante a análise teleológica
verifica-se que o impedimento previsto no dispositivo legal supra refere-se à
constituição, criação de uma nova sociedade e não à ampliação. No caso de
abertura de filiais, não se constitui nova sociedade e tão somente amplia a já
existente, pelo que se mostra ilegal a proibição de registro pelas Juntas
Comerciais dos pedidos, atualmente, para abertura de filiais de sociedades
entre cônjuges casados sob o regime da comunhão universal de bens constituídas
anteriormente a 11 de janeiro de 2003. Decisão interessante também se deu na 3a
Vara de Família e Sucessões de Porto Alegre que mediante a impossibilidade de
cônjuges abrirem filiais por serem casados sob o regime da comunhão universal
de bens, deferiu o pedido de mudança de regime de bens. (11) Decisão
semelhante aconteceu na 12a Vara de Registro Civil e Família de
Recife (PE). (12) Mediante tudo que foi explicitado, entendemos que
as sociedades comerciais entre cônjuges casados sob o regime da comunhão
universal não precisam fazer qualquer alteração em seu quadro social, haja
vista que o art. 2031 é inconstitucional, podendo inclusive abrir filiais sem
qualquer restrição.
Notas
01.
MENDONÇA, J. X. Carvalho. Tratado de Direito Comercial. Vol. 3. Rio de Janeiro:
Freitas Bastos, 1964; pg. 118-119.
02.
CAMPINHO, Sérgio. O direito de empresa à luz do novo código civil. Rio de
Janeiro: Renovar, 2003; pg. 56.
03.
KELSEN, Hans. Teoria geral do direito e do estado. 3a ed. São Paulo:
Martins Fontes, 1998; pg. 61.
04.
SANTOS, Antonio Jeová. Direito intertemporal e o novo Código Civil: aplicações
da Lei 10406/2002 – São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2003; pg.51.
05.
MAXIMILIANO, Carlos. Direito Intertemporal. Rio de Janeiro: Editora Freitas
Bastos, 1.946; pg. 197.
06.
DINIZ, Maria Helena. Lei de introdução ao código civil comentada. São Paulo:
Editora Saraiva, pg. 183.
07.
NUNES, Luiz Antônio Rizzatto. Manual de Introdução ao Estudo do Direito. São
Paulo: Editora Saraiva, pg. 171.
08.
MATOS PEIXOTO. Limite temporal da lei. Revista Jurídica da antiga Faculdade
Nacional de Direito da Universidade do Brasil. Vol. IX. pgs. 9 a 47.
09.
CAMPINHO, Sérgio. Op.cit.; pg. 56.
TEIXEIRA, Wendel de Brito Lemos; ATTIE, José Américo
Fonseca. A legalidade da permanência da sociedade de cônjuges casados sob o
regime da comunhão universal após o advento do novo Código Civil . Jus
Navigandi, Teresina, ano 8, n. 149, 2 dez. 2003. Disponível em: <http://jus2.uol.com.br/doutrina/texto.asp?id=4565>.
Acesso em: 22 jan. 2008.
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